DECLARAÇÃO SOBRE O ATUAL MOMENTO DA SECA NO SEMIÁRIDO BAIANO


A ARTICULAÇÃO NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO - ASA BAHIA, reunida em Feira de Santana-Ba, no dia 26 de abril de 2012, através desse documento, torna público o seu posicionamento em relação ao atual momento de seca no semiárido baiano.
As populações do sertão baiano estão enfrentando neste ano uma situação que não é nenhuma surpresa para quem conhece a realidade do semiárido brasileiro. Sabemos que as secas são previsíveis. E agora, estamos diante de um momento extremamente grave de longa estiagem.

Na Bahia, hoje, a seca já atinge grande parte da sua população, mais de 200 municípios decretaram estado de emergência. As plantas dos quintais produtivos, especialmente fruteiras, verduras e hortaliças, estão morrendo devido à falta de água. As cisternas já estão secas ou quase secas. Desde o ano passado não chove o suficiente para acumular água nas cisternas para consumo da família, nem para produção.

Ações emergenciais com carros pipa pelas prefeituras e o socorro do exército têm abastecido algumas comunidades com água para consumo humano, mas não são suficientes para garantir às famílias água de qualidade e alimentação adequada. Muitas veem-se obrigadas a comprar água para encher as cisternas e tentar amenizar o problema.

Efetivamente, a situação não está pior porque sociedade civil e governo muito já fizeram para garantir a água de consumo humano e produção de alimentos para a população difusa. No entanto, mesmo com as ações significativas já efetuadas, a infraestrutura ainda é insuficiente e inadequada para grande parte da população rural e urbana nos municípios do semiárido, dificultando o acesso à água de qualidade, a produção de alimentos e dessedentação animal.

Enquanto direito fundamental da pessoa humana, o acesso à água de qualidade deve ser garantido pelo poder público com adoção de políticas e ações necessárias que promovam a segurança alimentar e a dignidade a cada cidadão e cidadã.

A ASA, ao longo de sua existência, tem pautado os governos e potencializado o conhecimento produzido por agricultores e agricultoras, no sentido de garantir às famílias rurais uma vida digna, não com base na ideia de combate à seca, mas no espírito da convivência com o clima e o bioma caatinga. 

Diante desse quadro a ASA-BAHIA propõe o seguinte:

Medidas Emergenciais:

1- Que se estabeleça urgentemente um espaço de diálogo entre sociedade civil e Estado sobre o momento atual que o semiárido baiano enfrenta. Ao longo de muitos anos as organizações filiadas à ASA vêm acumulando conhecimento e experiências exitosas na convivência com o semiárido. Portanto, temos muito a contribuir também nesse momento emergencial. Queremos e podemos contribuir. 

2- Que o CONSEA e Conselho de Desenvolvimento Rural Sustentável se constituam em espaços privilegiados de controle social das ações articuladas pelo comitê estadual de combate aos efeitos da seca.

3- Abastecimento imediato e contínuo das cisternas com água tratada, bancada pelo Estado, logo, distribuída gratuitamente. Onde não for possível abastecer com água tratada, que seja acompanhada de hipoclorito para que as próprias famílias possam fazer em casa a filtragem e tratamento.

4- Disponibilização de recursos do Estado para contratar mão de obra local a fim de construir e/ou manter obras estruturantes  – cisternas (de cimento) para o consumo humano, tecnologias de captação de água de chuva para produção de alimentos tais como: cisternas calçadão, cisternas de enxurrada,  barragens subterrâneas, barreiros profundos, poços tubulares. 

5- Financiamento público para a alimentação dos animais.

6- Criação de comitês gestores municipais dos recursos públicos destinados às ações emergenciais, garantindo a representação majoritária da sociedade civil organizada.

Medidas Estruturantes:

1- Reconhecer o direito das comunidades ao acesso e garantia das terras e territórios para democratizar a água.

2- Continuar a implementação de infraestruturas nas comunidades rurais e urbanas com tecnologias e práticas agroecológicas que viabilizam a convivência com o semiárido.

3- Que o Governo Estadual lance, o mais depressa possível, a chamada pública para a construção de cisternas de placa e tecnologias de captação de água de chuva para a produção de alimentos. Não há razão para que se adie mais ainda essa chamada, quando os recursos já se encontram disponíveis. 

4- Implementar as adutoras – ou serviços de água – previstos no Atlas de Águas do Nordeste (Agência Nacional de Águas), dando prioridade às adutoras consideradas emergenciais, definidas em consulta à sociedade civil.

5- Frear o avanço das mineradoras para, assim, preservar a pouca água existente, uma vez que em boa parte do território baiano há o risco de que as insuficientes fontes de água existentes virem depósitos de rejeitos da mineração.

6- Rever a política de irrigação que demanda o dinheiro público e constrói canais para grandes empresas, mas não abastece as populações com necessidades básicas de consumo humano. É necessário lembrar que a Lei Brasileira de Recursos Hídricos (9433/97) define  que a disponibilidade de água deve priorizar o abastecimento humano e a dessedentação dos animais.

O quadro atual é grave! Há que se priorizar o socorro imediato às famílias que estão sem água, mas há a mesma urgência em investir em ações estruturantes para que essas famílias possam enfrentar os períodos de longa estiagem, cíclicos e previsíveis, sem passar fome ou sede. 

Seca não se combate. A perspectiva de solução para o semiárido está na convivência com o mesmo. Convivência que se constrói a partir da escola, da assistência técnica, do crédito e, no nosso caso específico, de construção de processos estruturantes definitivos. Neste sentido, conclamamos o Governo do Estado a construir uma política efetiva de estruturas partilhadas e descentralizadas de armazenamento de água, para que todas as famílias do semiárido possam ter acesso à água. É verdade que muito já foi feito. Contudo, muito mais resta ainda a ser feito e este é o papel fundamental do Poder Público, para o que também nos colocamos a disposição.

A persistir o cenário atual, a sociedade civil organizada se vê obrigada a mobilizar a população para uma pressão pública junto ao Estado e os meios de comunicação social para cobrar as medidas que se fazem tão urgentes e necessárias. 

Feira de Santana, 26 de abril de 2012.

Assinam o documento:

ACEFARCA e RODA (Microrregião de Bom Jesus da Lapa e Santa Maria da Vitória)
APAEB SERRINHA E MOC (Microrregião de Feira de Santana e Sisal)
ARCAS (Microrregião de Paulo Afonso e Cícero Dantas)
ASSOCIAÇÃO DIVINA PROVIDÊNCIA (Microrregião de Brumado)
CAA e CÁRITAS DIOCESANA DE IRECÊ (Microrregião de Irecê e Barra)
CACTUS e COFASPI (Microrregião de Senhor do Bonfim e Jacobina)
CÁRITAS DIOCESANA DE AMARGOSA (Microrregião de Amargosa)
CÁRITAS DIOCESANA DE RUY BARBOSA (Microrregião da Chapada Diamantina e Bacia do Jacuípe)
CÁRITAS REGIONAL NORDESTE 3 e CASA (Microrregião de Caetité e Guanambi)
CEDASB (Microrregião de Vitória da Conquista)
IRPAA, SAJUC, SASOP (Microrregião de Juazeiro)

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