Declaração da III Assembleia Latino-americana da Juventude Campesina

Leia a declaração da Juventude Campesina latino-americana, realizada durante Assembleia em Quito, Equador.

Nos dias 8 e 9 de outubro de 2010 - dia em que se comemora o aniversário da morte do comandante Che Guevara, e o Dia Internacional da Juventude Rural - reunimos 172 delegados e delegadas de 52 organizações em 17 países membros em toda a América Latina da Coordenação Latino-americana de Organizações do Campo (CLOC/LVC), além de convidados e representantes da Ásia e da Europa, totalizando cerca de 250 participantes para a troca de diferentes experiências e lutas dos jovens rurais, indígenas e afro-descendentes. Isto nos permitiu construir propostas e medidas específicas para o fortalecimento da articulação da juventude em nível continental.
 
Vivemos em uma época de crise global, onde existem três projetos diferentes de disputa política, social e econômico. Um deles é o projeto imperialista que se caracteriza pela presença de multinacionais, a criminalização da pobreza e conflitos sociais, a promoção do agronegócio. Outra, é a Unasul, que opera sob o discurso da conciliação de classes com ações concretas de integração continental e desenvolvimento, mas não o confronto direto com o imperialismo. Finalmente, há o projeto da ALBA, que se manifesta como uma estratégia de construção e reforço do poder do povo, sob os princípios da integração regional.

Por esta razão, denunciamos:

- A crise alimentar, econômica e social gerada pelo capitalismo

- A pilhagem e a privatização dos recursos naturais do nosso povo.

- A invasão territorial do modelo capitalista, através da implementação de sistemas produtivos alheios a concepção de nossos povos, por meio de instrumentos como algumas agências que servem ao império.

- O uso dos meios de comunicação como um instrumento de dominação que restringem a liberdade de pensamento.

- A imposição cultural a jovens através da mídia, que promove um modelo de vida baseado no consumismo, individualismo, sexismo e outros vícios do sistema capitalista

- O agronegócio como um resultado da aliança entre as empresas multinacionais, latifundiários e instituições financeiras, com os mega projetos de infra-estrutura, como a IIRSA e outros projetos da mesma natureza feitos pelos Estados para impor a sua concentração de terra, a produção de monocultura para exportação e a estandartização de alimentos.

- Implementação de políticas e programas assistenciais na América Latina, que não resolvem os problemas, ao passo que ocultam as políticas neoliberais e geram fragmentação, conformismo e dependência de comunidades.

- A adequação das legislações promovidas pelos governos a serviço das corporações transnacionais e dos interesses do capital.

- O aumento da concentração da propriedade da terra.

- A produção de alimentos que são basicamente para exportação e que anda de mãos dadas com o desenvolvimento de monoculturas e o uso de sementes transgênicas, que implicam no elevado uso de agrotóxicos.

- As ações repressivas dos Estados capitalistas através da militarização do povo, sob a suposta promoção da segurança nacional ante o terrorismo, o narcotráfico e outros slogans, que justificam a imposição das bases militares e o alistamento compulsório de jovens no serviço militar, assim como o controle dos povos e territórios.

- A manipulação e violação de Direitos Humanos pelo capitalismo, diante de Estados servis que não trabalham para o desenvolvimento da população em geral. Neste contexto, destacamos a falta de acesso à saúde, educação e terra.

- As empresas privadas não permitem o desenvolvimento local de pequenos e médios produtores, uma vez que promovem o consumismo e apagam nossas culturas e identidades.

- A violência à liberdade de expressão por meio de diversas formas de criminalização dos protestos e da pobreza. Também condenam todas as formas de discriminação contra as classes sociais, genêros, credos, entre outros.

- A ação das empresas transnacionais de mineração, hidrelétricas e agroindústrias que saqueam nossos recursos naturais.

- O livre comércio como uma forma de submissão dos nossos países ao imperialismo.

Diante desses problemas, os jovens rurais, indígenas, urbanos, internacionalistas, africanos e combativos; participantes do Congresso da CLOC/LVC declaram:

- Continuamos a defender a vida, justiça e soberania de nossos povos.

- Continuamos lutando por mudanças em nossa sociedade que passam pela reforma agrária integral, soberania alimentar e construção de poder popular a partir de processos que geram uma consciência coletiva.

- Nos assumimos como militantes e membros transformadores da realidade que precisam promover a formação para sermos parte da construção de uma sociedade justa e igualitária.

- Incentivar a revolta e indignação desta sociedade que nos oprime para fomentar os processos de luta e transformação.

- Defender valores e princípios que nos identificam como jovens na luta contra o imperialismo, como solidariedade, autonomia, integração, construção de unidade, diversidade, pluralidade, empenho, dedicação, respeito e dedicação.

- Respeitar a Terra e seus recursos naturais, de modo a manter a produção de alimentos saudáveis.

- Promover a agroecologia e formas de produção dos camponeses e povos afros e indígenas como alternativas para a crise alimentar e os preços elevados no mercado mundial.

- Defender o direito coletivo à terra e ao território e que não há soberania sem a organização popular.

- Reforçar o funcionamento do CLOC/LVC a partir de nossas organizações de base.

- Como os jovens, enxergamos a ALBA como um projeto estratégico para desenvolver uma ligação entre as áreas rural e urbana e, assim, devemos espalhar a compreensão e as ações deste projeto.

Com isso, decidimos:
 
- Avançar nos processos de formação ideológica, política e técnica, com prioridade para as mulheres, jovens e crianças, assim como buscar linhas comuns de formação em nível latino-americano, que sejam complementares em forma e métodos, considerando a pluralidade do continente, buscando formar nossos próprios técnicos e formadores

- Construir, melhorar e reforçar os mecanismos de comunicação das nossas organizações internas e externas que nos permitem gerar canais de comunicação mais objetivos, democráticos e participativos, buscando desenvolver uma agenda de ação comum.

- Para concretizar esses acordos, formamos uma coordenação continental durante a assembleia, que busca articular a juventude das organizações CLOC/LVC, composto por dois representantes de cada sub-região.

A Terceira Assembléia da juventude continental da CLOC/LVC se declara ainda:

- Pelo retorno imediato dos 5 heróis cubanos prisioneiros na prisão dos EUA por mais de 12 anos e contra o bloqueio econômico por mais de 50 anos com a república de Cuba.

- Contra a perseguição e assédio contra os dirigentes e militantes de movimentos sociais de nossos povos, como no caso da Colômbia, Piedad Córdoba, Honduras, Haiti, Guatemala e todos os povos que lutam.

- Rejeitamos o golpe de Estado em Honduras e a tentativa de golpe no Equador e todos os governos que buscam se impor pela força, bem como a instalação de bases militares dos EUA na Colômbia e em todos os países do continente que promovam esses processos de dominação

- Finalmente, oferecemos nossa solidariedade a todos os povos que lutam por um modelo de sociedade justo e soberana.

Vamos globalizar a luta e a esperança,

JUVENTUDE CAMPESINA, INDÍGENA, URBANA, INTERNACIONALISTA E COMNATIVA PELA VIDA, JUSTIÇA E SOBERANIA DE NOSSOS POVOS

Com o crescimento econômico, cai a migração do Nordeste para o Sudeste

Por Márcia De Chiara*

A parcela de nordestinos que migra caiu pela metade em relação ao pico da década de 90, alterando o perfil econômico das regiões.

A migração do Nordeste para o Sudeste está caindo. Com o crescimento econômico dos últimos anos, a saída de trabalhadores da região quase caiu pela metade em relação ao êxodo em massa dos anos 90.

O cálculo, feito pelo economista da LCA Consultores, Fábio Romão, leva em conta o número de migrantes em comparação ao total da população.

Entre os anos 1992 e 2002, o Nordeste perdeu o equivalente a 1,5% de sua população por ano para o Sudeste. Entre 2002 e 2007, a parcela dos migrantes que deixou a região a cada ano recuou para 0,98%. Em 2008 e 2009, a média caiu para 0,85%.

Para chegar a esse resultado, Romão considerou dados do estudo feito por Herton Araújo, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que avaliou o fluxo médio da migração no Brasil entre 1992 e 2009. Romão ponderou o resultado pela evolução da população em cada período.

"O que chama a atenção é que a população do Nordeste aumentou e um número menor de pessoas veio para o Sudeste", afirma o economista da LCA. Araújo, do Ipea, observa que a grande diáspora do Nordeste para o Sudeste ocorreu nos anos 90 e foi provocada pela falta de emprego, que diminuiu nos últimos anos.

"O fluxo do Nordeste para o Sudeste continua, mas não na mesma intensidade", diz o demógrafo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Fernando Albuquerque.

Viagens do sertão

Empresas que lidam diretamente com esses migrantes confirmam a mudança de tendência. A Viação Itapemirim, por exemplo, registrou nos últimos cinco anos queda de 10% no número de passageiros entre cidades do sertão e São Paulo e Rio de Janeiro. José Valmir Casagrande, diretor comercial da empresa, atribui parte dessa retração à melhora do poder aquisitivo na região.

Albuquerque, do IBGE, observa que os programas sociais estão segurando as pessoas nas cidades de origem em razão dos benefícios oferecidos. Mas Romão ressalta que a geração de postos formais de trabalho no Nordeste é o principal responsável pela retenção da população.

"O crescimento sustentado da economia, que gerou aumento da formalização do emprego no Nordeste, e o ganho real do salário mínimo, que indexa quase a metade dos salários dos trabalhadores na região, explicam a desaceleração do fluxo migratório", afirma Romão.

De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), as únicas regiões que registraram aumento da geração líquida do emprego formal de 2008 para 2009, no auge da crise, foram a Norte e a Nordeste, com crescimento de 40% e 12%, respectivamente. No mesmo período, o saldo do emprego formal no País recuou 31,5%. No Sudeste, a retração foi de 43,4%.

Dados da Pnad de 2008 revelam que 49% dos trabalhadores formais do Nordeste têm seus rendimentos atrelados ao salário mínimo. Romão destaca que, entre 2005 e 2010, o mínimo teve um ganho real de 49,7%.

Efeito no Sudeste

O recuo na migração provoca mudança também no mercado de trabalho no Sudeste. Esse é um dos fatores que contribuíram para a falta de mão obra no comércio, na construção civil e nos serviços domésticos. A tendência ainda é acentuada pela volta de muitos nordestinos que vivem no Sudeste e que retornam à terra natal, como a diarista Núbia Passos Couto (leia a história de Núbia e outros migrantes na página B3).

Um dos setores mais afetados pela queda do fluxo de migrantes é a construção. Segundo estudo do Ipea, 20% dos nordestinos que migram para o Sudeste vêm para trabalhar no setor. "A mão de obra no Sudeste está escassa e hoje está mais fácil admitir nas obras do Nordeste porque a oferta de trabalhadores é maior lá", diz o vice-presidente de Relações Capital e Trabalho do Sinduscon-SP, Haruo Ishikawa.

A maior disponibilidade de mão de obra para a construção no Nordeste aparece nos números do Caged. Nos últimos 12 meses até agosto, o Nordeste foi responsável por 35% da geração líquida de postos de trabalho na construção. Entre admissões e demissões, o Nordeste teve um saldo positivo de 116,1 mil vagas. No Brasil, o saldo foi de 331,6 mil postos de trabalho.

O quadro de falta de mão de obra afeta também os supermercados. "De cada 100 novas vagas, não conseguimos preencher 20", conta o vice-presidente de economia da Associação Paulista de Supermercados, Martinho Paiva Moreira. A queda no número de migrantes afeta especialmente a contratação de açougueiros, padeiros e confeiteiros. No passado, a maioria dos trabalhadores dessas áreas vinha do Nordeste, observa.

A própria expansão no Nordeste das redes nacionais afeta a contratação dessas mesmas companhias no Sudeste. "O mercado está aquecido em todas as regiões, mas temos tido mais dificuldade de recrutar pessoal em São Paulo e no Rio", conta a Magna Santos, diretora de Recursos Humanos do Grupo Pão de Açúcar.

Até 2005, cerca de 60% dos funcionários da empresa alocados no Sudeste vinham do Nordeste. Hoje essa fatia é bem menor. Nos últimos três anos, a rede abriu 2 mil vagas no Nordeste, o que de certa forma drenou parte da mão de obra que em outras épocas viria para o Sudeste em busca de emprego formal.

*Colunista do jornal OEstado de S. Paulo

Matéria publicada originalmente em: Economia e Negócios